Desabafo de um militar do sexo feminino do Teatro Operacional Norte


 Em áudio que circula nas redes sociais, um militar do sexo feminino desabafa sobre a missão no Teatro Operacional Norte (TON), na província de Cabo Delgado, que vem sofrendo ataques de insurgentes desde 2017.


O áudio, largamente partilhado nas redes sociais, questiona a alegada incapacidade operativa das Forças de Defesa e Segurança (FDS) no TON, bem como a fuga de informação que supostamente está a dar vantagem ao inimigo, a avaliar pelos últimos ataques ocorridos nos últimos dias em Cabo Delgado, em particular em Macomia. Eis alguns extractos mais importantes “ipsis verbis”:

 

“A situação do Estado não está boa, a situação dos militares moçambicanos também não é boa. Numa conversa, depois de muitas baixas que tivemos nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), há poucos dias, um colega diz-me num comentário simples: Quando o Estado moçambicano não parar de ser traidor, de ser falso, Moçambique ainda vai tombar.

 

Em Moçambique, ainda vamos comer areia, ainda vamos perder tudo, vamos ficar no zero. Porque quando mandam um efectivo que, supostamente, deve entrar em Macomia, já lá há uma posição há muito tempo, já está organizada, já está  pronta a combater, à espera desse efectivo. Ao chegar a Macomia, o efectivo enviado já é emboscado ou encurralado. Bloqueiam os quatro cantos e o efectivo enviado apanha fogo no meio. Por mais que você seja um bom guerreiro, um bom militar, por mais que tenha domínio de marciais, você acaba não fazendo nada, porque eles são traidores.

 

Existe uma traição entre eles e são tão falsos que até chega a doer. Eu que estou a falar não sou ninguém, mas eu relato sobre uma dor... um sofrimento. Prefiro não me identificar. Pedimos socorro aos revolucionários, se aí há alguém que nos possa socorrer, pedimos socorro. Filhos de pessoas... pais estão a tombar nas missões. São pais que estão a morrer e estão a deixar crianças... é o cúmulo. Quando você morre, ninguém se preocupa consigo. Ninguém procura entender a sua história, para poder ajudar. Ninguém vai atrás, você só tem valor quando está vivo, quando perde a vida, ninguém está nem aí para si.

 

Há dias, morreram 29 colegas e depois outros 19 também perderam a vida. As outras forças estavam lá, mas não fizeram nada. Quando os insurgentes chegaram no acampamento, começaram a chamar pelo nome do Comandante que estava no batalhão... que estava designado para comandar aquele efectivo, o que quer dizer que há fuga de informação. Os terroristas já sabiam de tudo. É estranho.

 

As FADM não têm armas potentes para destruir...o efectivo moçambicano, quando vai para a missão, leva apenas AKM, a mesma arma que só dispara duas vezes e a terceira encrava. Alguém me pode dizer se nós não temos morteiros e porque não podemos disparar mais alto...

 

Nós não temos base aérea... essas forças ruandesas e sul-africanas que estão aqui para nos ajudar, nos seus países não têm um helicóptero para ajudar Moçambique? Mas porque é que não usam? É porque os chefes têm as suas minas lá, cada um tem lá a sua parcela. Para eles aquilo é fonte de riqueza, enquanto nós ficamos aqui sem nenhuma carteira... pena dos meus filhos.

 

Nós ficamos aqui sem alimentação e eles estão a viver. Quando eu morro na missão, sem saber porque estou a lutar e para quem estou a lutar, isso é grave. O militar moçambicano devia sair para missão, tendo em mente o propósito da luta, mas não é o que acontece.

 

Socorro revolucionários. Se existe alguém que nos possa ajudar, socorro! Estamos a sofrer. Moçambique mudou a 100 por cento e Satanás aproveita-se desta situação para andar na base das pessoas e seio dos nossos dirigentes em Moçambique. Ele encarnou, está a fazer e desfazer, onde inimigos são os nossos próprios irmãos.

 

Por favor, alguém me ajuda a responder essa questão: para quem estamos a lutar? E para quê? Por favor, ajudem-me. Eu não tenho forças, perdi oito colegas num dia. Essas imagens que circulam nas redes sociais de mortes, de decapitação, são os meus colegas, são meus irmãos e até hoje não consigo ficar em pé, meu corpo fica todo arrepiado só de entrar no quartel. Eu vejo o rosto de cada um. É tão triste que não consigo trabalhar, estou há uma semana sem trabalhar. Ajudem-me. Estamos a lutar para quem e porquê? Peço ajuda”. (Carta)

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